Escrever é uma doença que se cura com o ato!
Espero que gostem de algo em particular, e se gostarem, mesmo que não comentem, "clique em cima do título" para que fique registrado.
Mas se você gostar, conte-me!
Writing is a disease and the act itself is the cure!
I hope you enjoy something in particular, and if they like, even without comment, "click on the title" for the record.
But, if you like what I write, tell me!
eder de sousa boaventura
sábado, 8 de dezembro de 2012
Motivação
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
Seção Quadras Singulares:
XIV: Conceito III
XIV: Conceito III
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Seção Quadras Singulares:
XIII: A Queda
XIII: A Queda
Sua presença incompleta
É a flâmula que não flamula!
terça-feira, 6 de novembro de 2012
Homens de Sorte
Ela ficou me contemplando por um tempo e disse:
... O jamaicano Usain Bolt, entrava para a história como o velocista mais rápido do mundo. Bolt, que logo faria 23 anos, fez a marca dos 100 metros em apenas 9,58 segundos - menos de 1 segundo para cada 10 metros percorridos. O mais curioso é que Bolt conseguiu terminar a prova em aproximadamente 41 passos, três a menos que a maior parte de seus oponentes. Especialistas calculam que suas passadas percorram uma distância equivalente a 2,439 metros, fazendo jus ao apelido recebido: "Lightning Bolt"
Três semanas depois, mal sabia ele que quase fora aposentado por um anônimo brasileiro de 32 anos de idade, que jamais havia posto os pés em uma pista de corrida. Se tal homem não contivesse as forças sobrenaturais que se apossaram de todas as fibras em todos os músculos que habitavam todo o seu corpo, Bolt, a esta altura, estaria relegado ao passado, como Carl Lewies, Ben Johnson e outros tantos que já nem nos lembramos.
Eu era capaz de sentir o olhar do público vagar ansiosamente entre a partida e a linha de chegada, como se o juiz fosse dar o sinal sem que ninguém estivesse pronto para a ocasião. Mais ansiosa do que eu, a platéia consultava o relógio a cada dois segundo perguntando-se quando é que a prova, que estava marcada para às 11:00 horas, iria começar, uma vez que já estava 23 minutos atrasada.
Para passar o tempo e me tranquilizar comecei a calcular distâncias e concluí que partindo da chegada até a linha inicial o tempo era drasticamente reduzido, apesar da distância ser a mesma inversamente...
Uma brisa suave e gélida percorreu o recinto e veio esquecer-se em minha face. A discrepância entre a minha temperatura e a externa fez brotar pequenas gotículas de suor pela minha testa. Tratei de limpá-las antes que virassem rios. Conhecia aquele tipo de brisa, já morara no interior anos atrás. Aquele ventinho sutil que vem como quem não quer nada, trazendo em si o suave e adocicado cheiro de terra molhada era o prenúncio de chuva. Das grandes.
Fechei os olhos e deixei-me absorver pelas imagens: pequenas gotas tornando-se poderosas e densas, arremessando-se furiosamente contra o solo de terra batida, levantando e levando aquele aroma singular para lugares inimagináveis e, tudo isto, chegando até mim feito a Cavalgada das Valquírias...
Mas o que minha mente queria que eu acreditasse ser Wagner, na verdade era Felix Mendelssohn e sua conhecida marcha nupcial composta para Sonho de Uma Noite de Verão.
Subitamente, toda aquela sensação de desconforto e fuga esvaíra-se de mim e, naquele momento, tornei-me o ser humano mais inexorável do mundo. E assim, enquanto Bel adentrava na Paróquia Nossa Senhora do Brasil, conduzida pelo pai, seu Virgílio, lembrei-me de quanto Usain Bolt era um homem de muita sorte.
Mas também me lembrei da minha própria sorte ao ver seu Virgílio, o Jaguadarte que virara meu chapeleiro Maluco no Glorian Day...
quarta-feira, 31 de outubro de 2012
Os 10 Mandamentos
Reloaded
Reloaded
Desta forma pode-se seguir com o fanatismo desenfreado em relação aos Clubes de Futebol. Também serve para os terroristas que se dão ao direito de se explodirem e explodirem outras pessoas, mas ficam indignados se você faz uma piadinha sobre Maomé, então fazem paseata, queimam bandeiras, destroem lojas, e eventualmente se explodem por ai.
* Novamente encontramos outro mandamento puro, ou seja, que não determina as circunstâncias; entetanto, ao contrário dos demais solicitamos que se o leitor for pobre e carecer de recursos e apoio jurídico respeite este mandamento a risca.
* Estão isentos deste mandamento: Presidente da República, Deputado - Federal ou Estadual - Governador, Prefeito, Vereador, Acessores Fantasmas e demais cargos elegiveis. Inclui-se também o ilustrissímo Paulo Maluf que é confesso, mas faz.
9 - Não dirás falso testemunho contra o teu próximo.
* Observe as palavras "contra" e "próximo"; assim: não dirás falso testemunho contra o teu próximo, que dizer que se não for contra pode e se não for próximo, também pode. Se for para dizer falso testemunho fale a favor e não contra; se for dizer contra, diga do distante e não do próximo. A lei é clara, o texto é que é confuso.
* Traduzindo: cuida da sua vida que da minha cuido eu.
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Dez aforismos
1 - Na má temática da vida amigo nenhum vale o dobro de um falso amigo.
2 - Se soubesse que a vida seria tão árdua, antes de chegar ao útero de minha mãe teria voltado aos testículos de meu pai.
3 - Paises como a China, as Coreias e o Japão devem ter as melhores polícias periciais que possam existir no mundo, por que se dependerem do retrato falado...
4 - Não é correto afirmar que Beltrano, Cicrano ou Fulano são burros feito portas. A tecnologia tem feito portas mais inteligentes.
5 - A expressão "politicamente correto" é um conceito fadado a piadas. Além de ser feito por palavas que na prática nunca estiveram de mãos dadas, parece que as pessoas se esquecem de que vivemos no Brasil.
6 - A pior coisa que pode acontecer na vida de um homem que busca pela verdade é encontrá-la.
7 - É a vida, e não a morte, que nos mata um pouquinho todos os dias. A morte é apenas o ápice do processo.
8 - Quando a obra é grandiosa, os personagens são maiores que o autor.
9 - Por que a beleza que não temos e somente a que desejamos sem querer alcançá-la, é tamanha fonte de inspiração?
10 - Crianças do mundo: por que cresceis?
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
Pudim de Pão Velho
6 a 8 pães franceses (mas não como aqueles brancos, decreptos e velhos sem graças que morreram nas guilhotinas durante a Revolução Francesa)
4 ovos inteiros (mas não daqueles provenientes das galinhas que se vendem na Augusta, em Moema ou em Pinheiros, principalmente das galinhas que são disfarçadamente frangos)
2 colheres de açúcar - ou a gosto (como o beijo de uma namoradinha difícil de se conquistar na adolescência)
1 pacote de coco ralado (como confetes que não eram redondos em um carnaval distante)
1 colher de margarina (como o beijo escorregadio da pessoa furtiva por quem nos apaixonamos de verdade)
1/2 lata de leite condensado (uns pecados proibidos de uma época de convento, ou de uma prima distante ou de uma namorada proibida)
2 copos de leite integral (fica aqui a imaginação de quem ler este ingrediente)
Modo de Preparo:
Pegue os franceses e afogue-os até amolecerem. Amoleça-os bem.
Esprema-os com as mãos até ficarem feitos minguais. Como a mídia tenta convencer você de sua insiguinificância. Insiguinificantes e franceses meia boca são ruins.
Jogue todo o resto sobre eles e misture até não os destinguirem.
Unte uma forma, feito lábia de político; povilhe farinha de trigo, feito campanha eleitoral e ponha a massa no lugar, feito o eleitor.
Jogue os confetes por cima e deixe-os assarem num clima tropical.
Vinte e cinco minutos depois teremos um delicioso pudim à brasileira; coisa que os franceses já dispensaram no início do século XVIII.
sábado, 13 de outubro de 2012
Fim do Mundo
Era para o mundo acabar ontem, dia 12 de Outubro de 2012, às 16 horas - diga-se de passagem. Pelo menos assim pensava Luis Pereira dos Santos, de 43 anos, que se auto intitulava como "profeta".
Na seita do Fim do Mundo - que não ocorreu - seus seguidores se desfizeram dos próprios bens materiais e a maior parte da arrecadação com a venda, obviamente, fora doada à seita. Em virtude disto, o "profeta", será indiciado por estelionato por usar o dinheiro para manter a casa onde eram realizadas as reuniões... Por acaso assim não o faz qualquer instituição religiosa?
Dentro da precária residência, localizada no Parque Universitário - uma das favelas de Teresina, Piauí - , foram encontradas cerca de uma centena de pessoas que seguiam a palavra do tal profeta. Enquanto que do lado de fora, além da multidão - outra centena - que observava o espetáculo, também havia um contingente de 100 homens da guarda civil e militar aguardando o desfecho. Ou seja, havia aproximadamente um policial para cada 2 pessoas no local. Um exemplo de eficiência das autoridades...
Também foi encontrada uma quantidade substancial de veneno para rato, o que levou as autoridades a cogitarem a possibilidade de suicídio coletivo dos membros da seita do fim do mundo. Tal suposição não é absurda se levarmos em consideração as façanhas de James Warren "Jim" Jones em 18 de Novembro de 1978, com o resultado de 918 mortes, entre outras de menor valor numérico, mas não menos considerável do ponto de vista vital, que já ocorreram ao redor do mundo.
Quando questionado sobre o fim do mundo não ter ocorrido, o "profeta" disse que deus o havia punido e que como forma de castigo cancelara o Juízo Final! Claro está, por esta declaração, o grau de importância do sujeito, uma vez que para o punir deus cancelou seus planos!
Dexando as ironias de lado, o curioso destas seitas e dos fanáticos que profetizam e terminam em suicídio coletivo ou individual (como é o caso do terrorismo) é que geralmente estão ligadas a religião, a qual, em sua maioria, refreia absolutamente a idéia de tirar a própria vida sob qualquer circunstâncias.
Apesar disto, assim como nas seitas, as pessoa vêm sendo submetidas, quotidianamente, a ver só aquilo que não presta, a ver o pior lado da raça humana, a ver que o mundo é cada vez mais perigoso "lá fora", e que a única salvação está na palavra do Senhor; palavra esta que é desvirtuada para os benefícios de quem a prega, como é o caso do referido profeta já citado neste texto e outros, que é melhor nem citar.
Antes que eu possa descarrilhar os vagões é necessário que entendamos que desenhos como Popeye foi retirado do ar porque o seu protagonista vive com um cachimbo à boca; não se passa mais Tom e Jerry, os antigos, porque a violência é muito explicita, Two and a Half Man somente de madrugada devido ao seu linguajar. Todas estas e outras mudanças são feitas com o proposito de evitar que as crianças seja sugestionadas por programas.
Entretanto, vejam os exemplos das mídias que são patrocinadas por entidades religiosas: programas vespertinos nos mostram assassinatos, perseguições policiais, roubos, estupros, mais assassinatos, dramas familiares, drogas, abusos contra crianças, mais assassinatos e por aí se estende das 13 às 19 horas; em seguidas nos mostram um jornal, com o resumo das mesmíssimas notícias e logo após uma hora de pregação com a palavra do Senhor... E isto se dá no mínimo cinco vezes por semana!
Bunda e peito não pode, são amorais, mas sangue e morte são legais!
Desta forma sou obrigado a me perguntar onde estão os desenhos para as crianças que não estão na escola? Todos temos condições de arcar com o custo de canal a cabo? Se as mídias televisivas se baseiam nas estimativas do mercado de consumo para fazerem a destribuição de seus progamas, que tipo de pessoas temos em casa atualmente? Mulheres de manhã, homens no almoço, psicopatas à tarde e santos a noite?
Escrevendo de uma forma politicamente correta, a sociedade está sendo induzida a uma forma de "reformulação do pensamento" ou "reeducação racional" ao se prostrar diante destes canais e absorver estas informações de tal maneira que a busca pela salvação é o único objetivo delas; enquanto que o objetivo desses canais de (des)informações é, único e exclusivamente, financeiro.
Há vinte anos atrás, quando quase ninguém era "politicamente correto" - concepção esta, que em nosso país une duas palavras que sempre foram antagônicas - e, portanto, menos hipócritas, eu diria em alto e bom tom que "o povão, a massa, que é destituída de formas educacionais que a possam blindar contra a manipulação de lideres carismáticos, cujo único objetivo é lucrar, sofre abusadamente de lavagem cerebral." Diria para que as pessoas "reparem que as mídias que estão submetidas a preceitos religiosos, nos dão a violência do quotidiano no horário vespertino e nos vendem a salvação em horário nobre."
Mas, infelizmente não estamos no mundo de vinte anos atrás, estamos no mundo de hoje, 13 de outubro de 2012. Um dia após o Apocalipse que não ocorreu. Para os fatalistas apocalípticos de plantão, peço que não se preocupem, pois 12/12/12 está próximo. Data esta que os Maias previram o Apocalipse.
Curioso é que não previram a própria extinção...
sábado, 6 de outubro de 2012
Processo Seletivo
- Mas o que quer dizer?
- Quero dizer: por que, acha, que, temos, um, vencedor?"
Diálogo entre Snow e Sêneca
Em Jogos Vorazes
- Você é o joio?
E o joio sendo pego de surpresa respondeu:
- Claro que não!
Então, seguindo aquilo que lhe fora instruido a fazer, o selecionador vira-se para o trigo e diz:
- Sinto muito, mas você está fora do processo seletivo.
E assim o trigo se retirou sentindo-se como fosse joio.
quinta-feira, 20 de setembro de 2012
Encontro Marcado
"...Talk about our future
Like we had a clue..."
- Katy Perry
07:48 AM
Sameera ergueu a
janela de seu quarto e, mais uma vez, como já estava acostumada a fazer todos
os dias desde criança, mas não naquela casa, contemplou o céu. Observou
calmamente as nuvens, que lentas e suavemente deslizavam sob o azul celeste,
tentando encontrar formas conhecidas... Mas hoje não havia rostos, não havia
animais nem nada que se assemelhasse a algo conhecido anteriormente; apenas
formas engraçadas que a lembravam de algodão doce: uma delícia conhecida
recentemente.
Através do céu
localizou o sol e por ele se orientou no espaço. Estendeu o balúchi sobre o
chão e orou. Agradeceu pelas maravilhas de antes e de agora; pelo sol, quando
havia sol, e pela chuva, quando havia chuva; rogou para que as pessoas fizessem
do mundo um lugar melhor para se viver e que sempre se pudesse olhar e guiar
aqueles que precisam de cuidados e caminhos... E tendo meditado sobre tudo o que
queria permaneceu em silêncio por incontáveis minutos...
Levantou-se
suavemente e, como se saísse de um transe, seguiu firmemente até a cozinha.
Pegou a chaleira. Abriu a torneira. Preencheu a chaleira com água. Fechou a
torneira. Levou a chaleira até o fogão e o acendeu. Enquanto a chama dançava no
fundo da chaleira, Sameera abriu a porta do armário procurando pelo chá preto
aromatizado com jasmim. De posse da embalagem, olhou-a como se meditasse em
qualquer coisa e optou por não tomar chá. Não... Hoje não é um dia para chás,
pensou. Pegou o pote com café e depositou quatro colheres bem servidas
dentro da água, que já começava a criar pequenas bolhas de ar nos cantos
internos da chaleira. O aroma do café preencheu intensamente seus pensamentos.
Delicioso... - pensou - com ou sem
cardamomo? Cardamomo era bom... - decidiu-se.
Enquanto o café era
preparado, Sameera seguiu até o banheiro e ligou as torneiras da banheira.
Sabia que a partir de agora teria uns dez minutos para arrumar suas coisas
antes que a água chegasse no limite ideal. Antecipadamente colocou alguns sais
e óleos de banho para que seus aromas pudessem se dissipar pelo ambiente junto
ao vapor d'água. Foi ao quarto pegar o roupão e o colocou próximo à banheira.
Olhou em volta como quem procura saber se não havia esquecido de nada...
- Aff! O café!
Correu até a chaleira
antes que a água entrasse em ebulição. No ponto, pensou. Apagou a chama.
Esperou que o café assentasse no fundo da chaleira, apanhou uma xícara no
armário e nela despejou o café. O cheiro deslizou tranquilamente por todo o
ambiente. Sameera caminhou tranquila, mas cautelosamente segurando a xícara
quente com as duas mãos, como se transportasse algo muito valioso, até o
banheiro. Colocou-a ao lado do roupão sobre um pequeno armário branco que
ficava ao lado da banheira.
Fechou a torneira e
graciosamente começou a se despir: peça após peça até que adentrasse na
banheira. O calor da água a envolveu como um intenso abraço e inevitavelmente a
imagem de Azzam viera a sua mente... Conhecera-o numa casa de chás que ficava a
três quadras de onde morava anteriormente. Sozinha, como de costume, desde a
perda dos pais em um atentado, tinha o hábito de tomar seu chá preferido na
mesma casa de chás que seus pais a levaram durante quase toda a infância. E foi
ali que conhecera aquele rapaz tão atrevidamente elegante e gentil, que lhe
perguntara se poderia respeitosamente fazer-lhe companhia... E como recusar
tamanha audácia e beleza, Sameera se questionou.
Inicialmente
conversaram sobre o tempo seco, sobre o café com cardamomo que ele pedira,
sobre o chá preto com jasmim que ela sempre tomava, sobre aquela cidade e suas
pessoas (as boas e as más), até que quase dois meses depois, assim que o gelo
verdadeiramente começara a derreter entre eles, foi que se arriscaram a falar
sobre si mesmos.
Azzam lhe contara que
dentre um ano partiria para a capital para concluir sua tese de História (Do
Cavalo de Tróia às Cruzadas: A Herança Bélica da História em Tempos de Jihad),
assunto que deixou Sameera tão admirada, que o espanto sentido por ela foi
denunciado descaradamente pelos seus olhos. Ela também lhe contou que pretendia
concluir os estudos na capital, mas que ainda demoraria um certo tempo, pois
estava no terceiro ano da Universidade.
- E o que você
estuda, se não se importa em dizer? - perguntou ele profundamente interessado.
- Sociologia... - Fez
uma pausa como quem espera ouvir algo, e não o ouvindo prosseguiu: - Pretendo,
um dia, me ingressar na ONU.
- Uau! - disse Azzam
- Pretensão demais?
- Não, nenhuma!
Daí em diante,
enquanto ensaboava suas pernas, Sameera lembrou-se que a conversa fluíra entre
eles como se já se conhecessem há anos. Azzam, que também tinha um passado
familiar em comum ao dela, explicou-lhe sobre os comportamentos cíclicos das
sociedades e seus aspectos econômicos; prenúncios de queda ou a ascensão de uma
ou outra determinada cidade ou sociedade e de como isso se enquadrava no
contexto atual...
E muito embora aquilo tudo fosse um pouco surreal para Sameera, ela estava
aproveitando cada momento. Para ela era um pouco difícil absorver tudo aquilo
que Azzam lhe dizia, não pelo assunto em si, mas porque sua mente não estava só
nas idéias de Azzam, estava também na forma com que seus lábios se moviam para
dizê-las; no gesticular de suas mãos quando queriam dar ênfases as palavras e
na maneira com que ele olhava para Sameera. No fundo era como se ele falasse
para dentro dela com todo o seu corpo e não somente para seus ouvidos...
Perdida nestes e em outros pensamentos, sem que se desse por si, suas mãos
deslizaram, sorrateiras, até a virilha; e, quando encontraram o objeto de
busca, inevitável foi não associar a ação ao personagem que permeava seus
pensamentos. Vasculhou a mente e o corpo em busca de tudo aquilo que a
fascinara em seus muitos encontros amigáveis, que ocorreram desde aquele
inocente café: Azzam e sua paixão pelos estudos; Azzam e suas questões sobre as
sociedades, que embora revelassem um certo grau de imparcialidade, eram
expressas de forma extremamente apaixonante através das questões que ele
levantava.
Sua maneira gentil e sedutora de excluir o mundo a sua volta e direcionar
absoluta atenção aos olhos de Sameera fazia com que ela se sentisse toda
especial a ponto de se ver como o único ser vivo merecedor daquela profunda
atenção. E talvez realmente o fosse... Lembrou-se de seus olhos - pérolas
negras que brilhavam como se possuíssem uma chama interna - esquentando-a
enquanto seus delicados lábios moviam-se apaixonadamente, dominando o assunto
proposto... e suas mãos, ah... suas intocadas mãos... tão intimamente tocando-a
naquele instante... ali naquela banheira... Fazendo-a sentir o roçar suave de
sua barba por fazer... e aquele cheiro tão característico de café com cardamomo
que o lembrava de forma tão profunda...
Sameera repousou a nuca sobre o encosto da banheira e deixou que seu corpo
padecesse por alguns instantes após o prazer experimentado. Respirava com
profundidade, como quem encontra o descanso após experimentar a extrema
exaustão... E realmente havia-a experimentado; afinal, pensou, que mal há em
conhecer-se?
Ensaboando-se, desta vez por completo, fez questão que seus dedos percorressem
todas as partes de seu corpo, como se fosse a primeira e a última vez que
fizesse isso. Maravilhou-se consigo mesma; e, excitou-se novamente, mas desta
vez se conteve. Ergueu-se e soltou o tampão da banheira; ligou o chuveiro para
enxaguar do corpo qualquer resquício de espuma e em seguida desligou-o.
Pegou o roupão sobre o armarinho branco e dirigiu-se ao quarto. Lá, deixou que
ele escorregasse pelo seu corpo em frente ao espelho grande do guarda-roupa e
novamente se admirou ao se ver nua. Secando-se diante do espelho, passou a
admirar seus seios, primeiro pelo espelho, depois diretamente para eles; e
embora pequenos, perante a maior parte dos seios das mulheres daquela cidade,
via os seus como uma afronta étnica, uma certa arrogância e impertinência por
serem empinados e rijos... Absurdamente lembrou-se das leis de Newton e riu
consigo mesma!
Virou-se de lado e, empinando-se nas pontas dos pés, acompanhou as curvas do
próprio corpo numa admiração inefável: nenhuma estria, nenhuma celulite...
Lembrou-se de Azzam e seus olhos negros e flamejantes... Se eles a pudessem ver
naquele instante...
Apesar de não estar acostumada, pegou o batom carmim, comprado recentemente, e aplicou-o
sobre os lábios. Puxou-os para dentro como se beijasse a si mesma e suavemente
soltou-os e delicadamente removeu os excessos com um lenço seco.
Abriu todas as portas do guarda-roupa e contemplou o arsenal que possuía. Saia?
Sarja? Leg? Não, leg não! Jeans? Jeans... Sim, era bem a ocasião. Colocou-o
sobre a cama e virou-se para escolher a parte de cima. Por um instante notou
que tinha tantas opções que diante de tanta variedade era fácil perceber que
não se tem poder de escolha sem que se ocorra uma certa indecisão anterior.
Cerrou os olhos e estendeu a mão. Deixou-a deslizar sobre os vários tecidos num
movimento de ida e volta... Parou. Apanhou a peça e abriu os olhos: era uma
regata lilás...
- Não! Regata não!
Optou por uma camiseta branca, peça que sempre casava bem com jeans... quase
tão bem quanto café e cardamomo... Sorriu ao lembrar-se. Virou-se para a gaveta
de trajes íntimos e, em seguida, contemplou-se mais uma vez através do espelho.
Não! Sem artifícios hoje...
Vestiu a camiseta que a envolveu como um colante. Seus mamilos se enrijeceram e
sobressaíram-se à forma da roupa. Apanhou a calça e a vestiu. Olhou-se
novamente de lado e contemplou as nádegas: perfeitas!
Calçou o All Star que estava na soleira da cômoda ao lado da cama e abaixou-se
sob ela para pegar o presente que Azzam lhe dera. Fechou as portas do guarda
roupa e vestiu-o.
Verificou se não havia esquecido nada ligado na cozinha ou no banheiro... Não.
Seguiu em direção à porta, apanhou a burca que estava pendurada no mancebo,
ajeitou-a ao corpo; pegou a bolsa e saiu.
Antes que pegasse o ônibus parou para tomar o seu chá de costume, mas ao
contrário de sempre, optou por um café expresso com cardamomo. Enquanto
esperava que o garçom lhe trouxesse o pedido, não muito distante dali,
chegava-lhe aos ouvidos o som do desfile militar. Embalada ao som da marcha e
pelo hipnotizante repique de tarol, lembrara de alguma coisa dentre as muitas
outras que Azzam lhe havia dito sobre o assunto:
- ... tudo isso é muita política disfarçada. Procuro enxergar as coisas de uma
maneira mais simplificada, sem maquiagens: no fundo, no fundo, somos todos
soldados lutando por causas alheias ou próprias... A diferença, e isto é
importante, é saber distinguir que quando se luta pelos outros - entenda outros
como a sociedade - eles, "o governo", treinam você, dão uniformes e
armas a você e dizem: mate por nós e se você fizer isso direitinho como nós
ensinamos e mandamos, nós lhe daremos dinheiro, medalhas e o chamaremos de herói!
Ainda que você nunca volte para casa, ainda que volte e nunca mais seja a mesma
pessoa...
- Senhora? - chamou o
garçom. E como não houve resposta ele tornou a chamar, aumentando um pouquinho
o tom de voz: - Senhora?! ... Seu expresso!
- Obrigada.
Sameera saboreou aquele café de gosto tão singular e aromático. Lembrou-se de
seus pais... Pôs o dinheiro sob o pires e dirigiu-se para o ponto de ônibus.
Aguardou poucos minutos até que o ônibus passasse. Quando o viu se aproximando,
estendeu o braço, dando-lhe sinal para que o motorista parasse. Subiu com certa
dificuldade os degraus do ônibus por causa da burca e, após pagar a passagem ao
motorista, encaminhou-se para o fundo do ônibus, que estava mais vazio.
Passando pelos assentos evitou, como sempre, olhar diretamente nos olhos de
seus ocupantes, na maioria pessoas de idades avançadas, alguns jovens
acompanhados de seus próprios pais e uns dois ou três casais de namorados. Mas,
mesmo assim, uma senhora de cabelos avermelhados mediu-a, de cima embaixo e
vice-versa, deixando que seus olhos verdes abruptamente despencassem sobre os
castanhos de Sameera. A mulher idosa bufou num gesto nítido de desprezo.
Sameera pensou em querer dizer algo, mas ficou apenas na intenção. Sentou-se no
último banco, próximo à janela do canto esquerdo do ônibus, e aguardou
pacientemente enquanto o veículo a conduzia ao seu destino.
À medida que se aproximava da parada, o som do desfile ficava cada vez mais
claro e seus sons preenchiam os pensamentos dela. Novamente sentia o compasso
da marcha e o reverberar do som do tarol, que estremecia sua alma... Percebeu
uma pequena vibração vinda de sua bolsa e nela buscou pelo celular. Havia uma
mensagem:
[onde você está?]
Ela digitou e enviou.
[no ônibus, a caminho da parada.]
O celular vibrou novamente:
[Smalla'Alik].
Sameera sorriu,
lembrando-se da maneira suave com que Azzam pronunciava aquela expressão sempre
que seus encontros findavam. E, enquanto Sameera mexia no celular, o ônibus se
aproximava da parada, velocidade diminuindo, ruas passaram a ter menos veículos
e mais pessoas. Guardas de trânsitos sinalizavam desvios e novas rotas; calçadas
repletas de pessoas indo em direção ao espetáculo.
Ela digitou outra mensagem
no celular, colocou-o de lado e passou a retirar a burca. Um dos rapazes que
estava acompanhado da namorada, percebendo a movimentação, que vinha da parte
de trás do ônibus, não se conteve, e, ao
olhar, sentiu-se hipnotizado pelos traços físicos de Sammera enquanto ela se
despia da burca. A namorada dele, atraída pelo movimento repentino da cabeça do
namorado, também olhou para onde o namorado olhava. Sem prestar muita atenção naquela
mulher atraente no fundo do ônibus, apanhou o queixo dele abruptamente e com a
mão tentou virar a face novamente para a sua atenção.
- Desculpe-me... -
disse Sameera olhando-a nos olhos.
- Não por isso! -
retrucou a jovem, muito a contra gosto.
É... não por isso,
pensou Sameera, ao se levantar e apanhar o celular. Acessou o botão que
sinaliza a parada do ônibus no próximo ponto; e, ao passar por aquela senhora
que a menosprezara anteriormente, olhou-a cegamente e disse:
- Se Allah pode perdoar
a senhora, com certeza, Ele, em sua extrema sabedoria e misericórdia, também
pode me conceder o perdão!
- Do que está falando,
moça?!
Mas Sameera não
estava mais em si para dar atenção a pergunta. Logo após apertar a tecla send,
ouviu pela primeira vez o som do celular que Azzam havia posto do lado esquerdo
do colete que lhe dera. E, antes que seu último pensamento se formasse - sendo
este a lembrança de que esquecera a janela aberta -, sentiu-se, subitamente,
pela segunda vez naquele dia, envolvida intensamente por uma onda de calor...
Entretanto, desta vez, o calor fora tão extraordinário que não só a abraçara de
forma definitiva, como também estendera seus braços ardentes a todos os vinte e
oito ocupantes do ônibus e pouco mais de umas trinta pessoas que estavam
próximas a ele na rua.
***
14:26 P.M.
Não muito distante de
onde o atentado contra o desfile militar ocorrera, em cômodo simples de um
bairro no subúrbio, após raspar a barba e os cabelos, Azzam Faris, cujo nome
real nunca fora este, bem como a profissão real também nunca fora aquela,
visualizou a mensagem que recebera em seu celular:
[Insha'Allah].
Está feito - pensou.
E assim, como das outras vezes, passadas e futuras, após separar a pasta
contendo todos os dados sobre a vida de Sameera Fadwa e todos os documentos em
nome de Azzam Faris, incluindo o celular, arremessou-os dentro de um pequeno barril
de aço onde chamas de querosene ardiam.
Agosto/Setembro de 2012
sábado, 15 de setembro de 2012
Indelével
Do alto da colina dos anseios contemplo todos os funerais que há em mim:
Sonhos, que nunca serão, enterrados na vala comum do que sou...
E encerra-se em mim o tiro letal que não matou;
A fuga desenfreada, da qual ninguém escapou;
Da criança sem sono, no escuro, seu desespero;
Os homens de preto, sérios, no enterro;
A balança alterada do Bem e do Mal;
Os selos corrompidos do Juízo Final;
O canudo lacrado escondendo um diploma;
A felicidade inerte em dezesseis anos de coma;
A ironia do sobrenome (sorte?);
A vida que talvez só me encontre na morte;
O suicida e seu próprio fracasso;
A lentidão do tempo devorando o aço;
A cicatriz antiga que encolheu e fechou;
A verdadeira ferida que nunca cicatrizou;
A lágrima que escorreu e pingou e ninguém viu;
O pássaro belo que preso ninguém mais ouviu;
A porta aberta pela qual ninguém entrou;
O noivo no altar que a noiva abandonou;
O grito que morreu assim que saiu;
O olhar de deus, que me ignorou e partiu...
Jazem em mim, adormecidas, todas as possibilidades impossíveis de serem
Às margens de erros de todas as estatísticas incompreensíveis:
Folhas secas que me caem do espirito
Como variáveis negativas sem soluções mirabolantes...
terça-feira, 4 de setembro de 2012
Pintura Íntima
sábado, 25 de agosto de 2012
... E assim se foi a infância
- Sabia!? Como?!