terça-feira, 22 de março de 2011

O vento varreu as folhas secas...

 

O vento varreu as folhas secas
Que estavam no chão da praça de outrora.

A saudade, ao partir, esqueceu no banco de cimento,
Como coisa que se perde e demora-se a notar,
A fria lembrança de algo que fora importante
E hoje talvez não seja mais.

O progresso veio concretizando a paisagem ao redor
E as pessoas disfarçaram colorindo casas roupas lojas bocas e cabelos
De tons que nem a natureza ousou criar.

Os carros e seus motores barulhentos e suas buzinas ensandecidas e seus motoristas exaltados
Assassinaram os sons dos galhos balançando e crescendo,
Dos passos dos pedestres passando,
Do estalo sem vida da folha seca ao ser pisada,
Dos pássaros que desistiram de cantar pois não se ouviam mais
E de outras coisas que se perderam porque não conseguiram acompanhar o ritmo.

(Uma moça solitária chega à praça e no banco senta-se.
Da bolsa a tiracolo tira um envelope e dele uma carta dobrada.
Relê com olhos cansados o conteúdo como fosse novidade
E sentindo a dor a bater-lhe no peito deixa-se chorar mais uma vez.
Dobra a carta com uma certa ternura, coloca-a de volta no envelope,
Seca as lágrimas que ainda não tinham secas à face. E olha
O lugar de outrora com cara de hoje pelos olhos úmidos do agora. E sente
No coração a faca imaginária da despedida a atravessar-lhe. E rasga
Em mil pequenas folhas aquelas folhas. E joga
Sem remorso algum tudo ao solo. E vira-se
E parte.)

O vento varre as folhas secas
Que estão no chão da praça de hoje.

A saudade, ao voltar, há de procurar no banco de cimento,
O que não deveria ter esquecido, mas o fizera,
E, quem sabe, encontre a doce lembrança de algo que fora importante
E, quem sabe ainda o seja...

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